No calor das cozinhas da Brasília, onde o machismo ainda ferve e o preconceito ainda amargo, cinco chefs LGBTQI+ transformaram suas trajetórias em resistência e sabor. Na véspera do Dia Internacional do Pride, realizada neste sábado (28/6), suas histórias mostram que amor, identidade e força se encaixam e brilho entre panelas e fogões.
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ELE Metrópole Ele conversou com cinco chefs LGBTQIA+ que trabalham em Brasília para entender o que é viver sua identidade nas cozinhas ainda marcadas por preconceitos e estruturas conservadoras. Entre os desafios, invisibilidade e realizações, eles compartilham suas histórias de resistência, orgulho e amor pelo que fazem.
Mónica e Barbara: força e afeto entre panelas
Monica Nunes e Barbara Bicicalho formam mais de um casal na vida: eles são parceiros na cozinha. Casados por sete anos e com uma história de amor que durou 10, eles enfrentam os desafios de serem duas mulheres lésbicas, empresas e chefs em um espaço historicamente dominado por homens.
Para Monica, o primeiro obstáculo nem é sua orientação sexual: “Primeiro vem nossa existência feminina nesse espaço. Ainda precisamos demonstrar que as mulheres podem fazer carne de porco, podem fazer churrasco, podem comandar a cozinha. Isso é uma merda”.
Ela se assemelha a situações em que sua autoridade foi questionada pelos homens da equipe, ridicularizada pela religião e até pelos comentários sexuais deslocados, como se, como lésbica, tivesse o mesmo aspecto malicioso que os homens dirigidos às mulheres. “Eu também sou uma mulher. Vivemos, pagamos impostos, temos família. Não é apenas um desejo.”
Barbara se lembra do espanto do pai de um namorado por um casamento em que eles estavam trabalhando, descobrindo que eram lésbicas: “Ele perguntou por que não gostamos do homem. Como se fosse uma questão de ódio. Era muito vergonhoso”.
Mesmo com os desafios, eles criaram dois negócios juntos e ainda resistem. “Nosso espaço em gastronomia é feito de respeito, delicadeza e força”, acrescenta Monica.

Raquel Amaral: da lancheira à resistência
AUTO -ADA, Raquel Amaral começou a vender almofadas e agora atua como um chef pessoal. Sua carreira é marcada por confrontos difíceis. No início de sua carreira, como subchef, ele passou por uma equipe hostil masculina que não a respeitava, escondeu informações e ignorou sua liderança. Um dos chefs até a ameaçou com uma faca.
“Ele era apenas um homem na cozinha. Um dia, um deles se recusou a seguir minhas ordens e me ameaçou com uma faca na minha mão. E, no entanto, os proprietários dos restaurantes queriam suavizar. Eu saí. Não aceitei que eles me tratassem dessa maneira”.
Para ela, o machismo permanece forte, especialmente entre os “grupos” da gastronomia brasileira: “Você sempre vê os mesmos nomes, quase todos os homens. As mulheres são poucas e lésbicas ainda menos”.

Ray Neto: entre o uniforme e o fogão
Chef e militar, Ray Neto vive uma dualidade incomum: enquanto nas forças armadas ele sente mais preconceito, no restaurante que encontra bem -vindo.
“Na cozinha, o tempero fala mais forte que os preconceitos. Acho que o público da Brasília olha para a comida, não a orientação sexual. Mas, é claro, o preconceito ainda existe. A gastronomia me fortalece”, diz ele.
Mesmo assim, Ray sabe que a aceitação total continua sendo uma utopia: “O preconceito hoje é mais velado. Mas ainda está lá, escondido nos cantos. Precisamos continuar trabalhando bem e orgulhosos de nossa identidade”.

Gilberto Masi: cozinha como um espaço político
O chef Gilberto Masi chegou de São Paulo a Brasília em 2009. Hoje, o chef do paradeiro, uma biblioteca de casos na ala norte, vê avanços na inclusão, mas sem romantizar: “Tem mais abertura, mas o machismo ainda está lá. Comentários, desconfiança …”.
Sua estratégia é a concorrência: “Eu sempre impor o trabalho. Não tento agradar quem tem preconceitos. Faço meu trabalho bem feito e pronto. E se eles gostam de paciência ou não”.
Além disso, ele usa sua posição para abrir portas: “Sempre que posso, dou uma chance de quem é o LGBT. Porque eu sei que é difícil perfurar essa bolha. Precisamos conseguir o nosso”.
